Senhor,
esta noite, a música era alta,
as luzes dançavam,
e os risos cortavam o ar como faíscas felizes.

Mas eu…
eu estava ali, parado,
no meio de todos,
como uma sombra esquecida no canto.

As palavras passavam por mim,
sem me tocarem.
Os olhares deslizavam,
sem me verem.

Eu ri, Senhor,
para que não percebessem a dor.
Fingi estar bem,
mas por dentro, o riso era pedra.

E quando ela passou —
aquela por quem o coração espera um olhar —
foi como se o tempo se abrisse em dois:
um para os outros,
cheio de vida,
e um para mim,
cheio de vazio.

Senhor, por que dói tanto ser ninguém?
Por que o meu coração é tão grande,
e o mundo tão pequeno para acolhê-lo?

Voltei para casa devagar,
com o rosto cansado e os olhos secos.
Mas lá dentro,
um grito silencioso pedia:
“Vê-me, Senhor,
porque ninguém mais vê.”

E então, no escuro do quarto,
quando a música da festa já era lembrança,
eu senti — bem fundo —
que Tu estavas ali,
esperando o meu silêncio.

Não disseste nada,
mas Tua presença era como uma luz mansa,
a dizer-me que ser desprezado pelos homens
não é o fim,
é o início do caminho
onde o coração aprende a amar sem medida.

Meu filho,
eu vi quando te encostaste à parede,
com o copo na mão e o riso disfarçado.
Vi quando fingiste procurar alguém,
só para não parecer sozinho.

Eu vi —
não com os olhos dos outros,
mas com o olhar que atravessa as máscaras.

Enquanto o salão brilhava,
e as vozes se misturavam em vaidade e medo,
o teu silêncio me chamava.

Não te desprezaram,
meu pequeno,
apenas não te viram.
E não te viram porque ainda não aprenderam a olhar.

Eles procuram brilho,
tu trazes profundidade.
Eles colecionam aplausos,
tu carregas sede de sentido.

E essa sede — sim, essa dor que te fere —
é também o dom que te guarda.
Ela te impede de ser raso,
te faz verdadeiro,
te torna capaz de amar um dia.

Eu estava ali,
não na música, nem nas luzes,
mas na tua solidão que doía como um grito contido.
Estava ali,
esperando que te lembrasses
que o amor que realmente te preenche
não precisa de plateia.

Então, não temas o desprezo.
Ele é só o vento que varre a poeira,
para que apareça o ouro que pus em ti.

Um dia, alguém te verá como Eu te vejo —
não pela aparência,
mas pelo fogo discreto
que guardas no peito.

Até lá,
permanece fiel ao seu coração,
porque é dele que nascerá
a tua força,
a tua ternura,
e a tua luz.

Autor: Ricardo Córdoba Baptista

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